Respeito, Tolerância,
Igualdade, Inclusão, são palavras que ouvimos constantemente, quer pela
comunicação social, quer no nosso dia a dia, nos mais diversos contextos.
Assistimos à adoção em massa de um discurso que hoje é tido como socialmente
correto no que diz respeito a questões como a orientação sexual. No entanto, é
necessário analisar e desconstruir esse discurso de forma a tentar compreender
se o mesmo corresponde à apropriação do conceito que ele próprio encerra, isto
é, a consciência para práticas que têm em conta a diversidade.
De acordo com os
resultados da investigação de carater qualitativo que pretendeu aceder à
compreensão dos discursos e da ação de professores, a lecionar na ilha de São
Miguel, em relação à homossexualidade, e que deu origem à dissertação de Mestrado
Discursos sobre homossexualidade numa
comunidade educativa: perspetivas de professores (Rodrigues, 2012),
apresentada na Universidade dos Açores, ainda existem muitos constrangimentos
em relação à homossexualidade, embora muitas vezes camuflados por um discurso socialmente
polido. De um modo geral, encontraram-se professores que conseguem identificar
preconceitos, estereótipos e situações de discriminação devido à orientação
sexual, tanto na sociedade como na escola. No entanto, eles próprios têm
enraizado o modelo heterossexual da sexualidade, de que fazem uso, tanto na
vida pessoal como na prática profissional.
Na escola, é a partir
da ideia de heterossexualidade que os conteúdos são elaborados e que os
discursos são produzidos. Perguntar a um rapaz "Já tens namorada?" e
a uma rapariga "Já tens namorado?", ignorando outras possibilidades
de relação afetiva, é algo que está tão interiorizado e mecanizado como "a
ordem natural das coisas", que parece não admitir outras formas de sexualidade.
No referido estudo, apenas uma professora evidenciou a utilização de um
discurso abrangente, justificando para tal as diversas formações que teve sobre
sexualidade e afetos, as quais lhe despertaram para a importância da utilização
de um discurso respeitador da diferença.
Ainda de acordo com os
resultados desta investigação, a referência à homossexualidade como forma de
insulto entre alunos parece ser uma prática tão comum que, na generalidade, não
é considerada uma forma de agressão. Comentários como "maricas",
"zabela" ou "paneleiro" fazem parte do dia a dia escolar e são
muitas vezes ignorados pela comunidade educativa. De facto, parece existir uma
grande lacuna na formação dos professores no que se refere à sexualidade e, especificamente,
à homossexualidade. Estes profissionais, que deveriam ser os principais agentes
de mediação e combate de práticas discriminatórias dentro da escola, pela
afirmação ou pelo silenciamento vão legitimando determinadas práticas sexuais e
reprimindo outras, e assim exercendo uma pedagogia da sexualidade, muitas vezes
sem terem disso consciência.
Toda esta problemática
ganha particular relevância quando falamos de adolescentes, pois para além das
profundas alterações que vivenciam a nível físico e nos domínios cognitivo,
psicológico, afetivo e relacional, têm a complexa tarefa de conciliar todas
essas transformações com a exigências sociais e esperanças pessoais de formar
um autoconceito coerente, isto é, uma identidade. E se a escola nega ou ignora
outras formas de sexualidade que não a heterossexualidade, está a oferecer
poucas oportunidades para que os adolescentes e jovens assumam, sem culpa ou
vergonha, a sua orientação sexual.
Então, se queremos realmente uma sociedade mais
justa, podemos começar por alterar os discursos. A discriminação não se
manifesta apenas por atitudes violentas e homofóbicas, vindo, muitas vezes, dissimulada
em discursos que se dizem "tolerantes".
Citando o escritor
Vergílio Ferreira, "Há no
homem o dom perverso da banalização. Estamos condenados a pensar com palavras,
a sentir com palavras, se queremos pelo menos que os outros sintam connosco.
Mas as palavras são pedras”. E, infelizmente, não são levadas pelo vento. Pelo
contrário, vão deixando marcas nas histórias pessoais e moldando quem as ouve.
A escola, como espaço que propõe educar e propiciar recursos
para a evolução intelectual, social e cultural do homem, tem o dever de formar
gerações mais informadas e sem preconceitos. Mas todos nós, enquanto sociedade,
também temos um papel. Não somos só o produto, também somos produtores da
sociedade em que vivemos.
Na equação do respeito pela diversidade,
as únicas variáveis somos nós. Não deixemos que esta seja uma tarefa para
"os outros", pois "os outros" dos outros, somos nós.
- Catarina Rodrigues
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